Debate Turismo, Industria e Ambiente
Turismo, indústria e ambiente. Três dos pilares do desenvolvimento pretendido para a Figueira da Foz deram o mote, esta terça-feira à noite, no CAE, ao colóquio que juntou o arquitecto Manuel Traveira, autor de uma tese de mestrado intitulada «Do Cabaret ao Deserto» a elementos do movimento cívico SOS Cabedelo – Eurico Gonçalves e Miguel Figueira – ao especialista e coordenador do Grupo de Trabalho Litoral, Filipe Duarte Santos, e ao director da Celbi e presidente da Comunidade Portuária da Figueira da Foz, Hermano Sousa, para uma conversa moderada por Miguel Babo. A iniciativa, inserida na programação do Figueira Film Art 2015, contou com uma plateia de cerca de 60 pessoas.
Da Praia da Claridade à Praia Grande
Não consta que o areal da Figueira da Foz queira roubar o nome à praia de Sintra, mas se o tamanho fosse o critério, há muito que a Praia da Claridade teria ganho o nome à sua congénere a sul. Podia ter sido de outra forma? Sem intervenção humana, provavelmente não. Foi pelo menos isso que defendeu Manuel Traveira, que estudou a evolução do areal figueirense no seu mestrado. “Ao fazer a pesquisa, durante dois anos, deparei-me, entre outros, com um relatório do Laboratório Nacional de Engenharia Civil que, em 1958, já abordava as questões do assoreamento e do crescimento do areal, admitindo a necessidade de lançar mão de meios artificiais para a pré e/ou pós-eliminação das areias a norte e transposição das mesmas para as praias a sul… um relatório de 1958 que podia ser da actualidade”, lamentou, alertando que a procrastinação da resolução de um problema tão antigo terá como consequências “a continuação do crescimento da praia, a formação de arribas” e a ocorrência cada vez mais frequente de “ondulações fortes prejudiciais a pequenas e grandes embarcações”. Danos para o porto comercial e, por arrastamento, para a indústria da região, a que se juntam, segundo o arquitecto, os danos para o turismo. “A relação da cidade com o mar tem vindo a diluir-se, de facto já não existe”, disse. Prolongar mais os molhes, defendeu, “já não é uma solução exequível”.
Quem esperasse, ontem, contraditório à posição do movimento cívico SOS Cabedelo, que tem publicamente defendido a construção de um by-pass (um túnel para deslocação contínua das areias das praias a norte para as a sul), sairia desiludido. Duarte Santos considerou que o caso da Figueira da Foz “é dos mais gritantes” no que respeita à erosão costeira, e defendeu que “não há incompatibilidade entre ter um porto e uma praia que não seja exageradamente grande, como a que existe actualmente”, desde que seja encontrada e posta em prática uma solução. “E não tem nada de extraordinário, basta o transporte das areias a Norte para Sul”, resumiu. “Na Austrália, num caso semelhante mas mais complicado em termos de traçado, a solução do by-pass resultou”, adiantou. “O que é preciso é que os poderes públicos tenham em sua posse estudos fiáveis e se disponibilizem a fazer análises de custo-benefício e a implementar a melhor solução”, sintetizou, adiantando que, na sua opinião, o by-pass fixo é mesmo a melhor resposta a longo prazo.”E Portugal tem uma longa tradição de engenharia costeira”, lembrou, afirmando-se convicto de que “estão reunidas as condições para avançar”, uma vez que, acredita, “há verbas comunitárias” disponíveis. “E é o necessário: vontade política e financiamento”, sumariou.
“Então, o que falta?”, perguntou Miguel Babo. Para Filipe Duarte Santos, que seria secundado pelos demais intervenientes e até por pessoas na plateia, “falta desde logo a mobilização das pessoas”, a exigência de respostas por parte dos cidadãos aos poderes públicos. “Somos todos responsáveis”, afirmou, admitindo que, nos seus contactos com a Câmara Municipal da Figueira da Foz, sentiu “alguma desconfiança em relação à existência de verba que permita levar até ao fim um projecto desta dimensão”.
Hermano Sousa não emitiu opinião sobre a melhor solução mas admitiu a existência do problema. “Chegámos a uma situação limite, em que a dimensão da praia não é viável e, uma vez que as respostas tradicionais já não servem, é preciso pensar fora da caixa”, defendeu. Evitar o assoreamento e os movimentos de água que dificultam a navegação e a transposição da barra tem de fazer parte da equação que conduza a um resultado positivo para a trilogia Turismo, Indústria e Ambiente. “A Figueira da Foz é um dos mais importantes polos da indústria florestal, e o seu porto movimenta já na ordem dos 2 milhões de toneladas de carga”, sublinhou, em conclusão.
Ao longo da noite, Miguel Figueira e Eurico Gonçalves deixaram, também, contributos para uma conversa que acabou por não ter contraditório, já que a solução do by-pass foi incontestada. Até ao momento, a autarquia figueirense ainda não tomou posição definitiva sobre o caminho apontado pelo movimento cívico SOS Cabedelo, mas a vereadora com o pelouro em questão, Ana Carvalho, apesar de ter sido convidada a expor a análise do município, não marcou presença no colóquio.